O dia se fez longo na vigília da angústia e desespero de um homem. Seus braços iam e vinham com vigor e sincronia. E não voltou como antes da viagem que o partiu, naquele dia. Um homem esquálido, um pêndulo obstinado em desalinho ora ao norte, ora ao sul na caminhada interminável. Toneladas de agonia e desordem mental pesavam e marcavam fundas, as suas pegadas na areia. Passos ritmados de um homem cabisbaixo, atordoado e aflito. Ia, vinha, parava na ponta do mar à beira e com olhos fixos e perdidos no horizonte do mundo, prenunciava seu desejo - seu novo destino - O mar, morada prá sempre do nada que se sentia pois perdera seu único amor. Ela não cansava, ficava bem perto, silente, atenta, em vigília. Observava e registrava, nos sinais, sua intenção. Estava alerta e pronta para agir, contê-lo, abraçá-lo, protegê-lo. Ele era um planeta convulsionando em emoções, em desespero e medo. À parte, sua expressão facial que em momentos ria e noutros adensava a tez e depois, com o indicador, apontava uma nova decisão. A seguir mudava a rota e novamente cabisbaixo, seguia sem rumo, sem norte, ao vento. De seu mundo era ele mesmo o único ser vivente e em si, uma verdade hostil - seus fantasmas, suas culpas, suas sombras e na emoção desgovernada, um deslugar, um desdesejo de ficar, de existir... Subiu o aclive da areia e a seguir, parou frente uma casa branca, portões azuis, janelas largas, uma rede vermelha na varanda. Olhou, apoiou-se ao muro, bateu palmas, chamou alguém e pediu água. Olhos de espanto viu algo e assombrado desistiu retomando apressado o caminhar sem tréguas. Agora e sempre, sem emitir qualquer som, ela caminhava ao seu lado. Cúmplice ela imprimia solidária o seu ritmo, ao lado, juntinho, naquela viagem sem roteiro e sem destino no des_tino de um Ser, em sua desordem humana. Um ir e vir, um descaminho e ele percebe que não está só. Prisões sem grades são cárceres perpétuos da mente humana...
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Arte: Sigmar Polke
Música: The last mohican
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