Por Sueli Maia (Mai) em
12/30/2009
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O tempo passa e inevitável é pensar que amanhã será um dia comum, talvez último, com horas a menos e a mais. Admito ser estranho lembrar Duomo e Pisa neste instante e tão incomum quanto instigante é pensar as sutilezas e os poderes que sustém o oblíquo. Então abro os olhos para o espectro da euforia e piso o chão. Eis o poder de inspirar o ar. Evoco uma fibra qualquer e a memória da pele. Porque talvez a rebeldia do oblíquo seja essa teimosia que faz resistir, desafiar ou irromper entre as fendas uma vida qualquer. Porque o desvão de um baque é uma brecha e a valentia da ferida é uma crosta e no exposto disso tudo eu agacho e limpo qualquer coisa que escorra. A persistência de cambaio é a cena do atleta que completa a maratona e desmaia após a linha. Retrovisores do tempo em datas comuns. E cuidar do engano do engodo do crédito é estima, e viés que rima é erro, e honra é rito e do guerreiro o grito é guerra. E naturalmente é só dezembro que está acabando ou mais um janeiro que volta com um sopro de vida que vem prá mais tempo e história. E ela volta com fatos que emergem ciclicamente. E reprisando, tudo é como o filme biográfico que se faz em culatra e deflagra no biografado a memória dos seus ideais. Amanhã, numa tela ou na areia, menos e mais um dia e vida a mais e a menos junto ao pulo do ponteiro. E depois respirar, chorar, sorrir, abraçar e escrever o novo numeral e traçar metas e desejar nos rituais de reinício. E assim eu desejo mais fôlego na travessia dessa lâmina d'água que refrigera e desperta para um novo e simples bom dia!
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Bom 2010 para todos!
Imagem: Google
Por Sueli Maia (Mai) em
12/23/2009
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Talvez eu seja apenas uma estranha correspondente das linhas que escrevi e nunca soube ao certo destinar. O certo é que não ouço vozes, mas sinto um impulso flagrante ao qual cedo, porque escrevo destinos, quereres, saudades e dos amores suas guerras e paz. Houve dores que ao descrever também pude sentir. Escrevi intenções e vazios, mas também os sorrisos, explosões e olhares que percebi como miragens a inspirar-me poesia. Descrevi realidades tão estranhas como linhas paralelas que estando em mesmo plano não encontram um ponto em comum. Não sei se fiz bem porque talvez estas cartas sejam apenas migalhas sem valor, mas deste ofício em que me fiz correspondente, eu literalmente o fiz por amor ao amor. Então escrevo esta ultima carta que fala de um presente e que junto às demais posto à frente da hélice de um imenso avião que por ai as haverá de espalhar.
"Meu amor, não te aflijas. A minha perna já não dói. Mas antes de ir-me de uma vez, eu preciso dizer que me deste o meu maior presente que chamamos Simone. Um beijo."
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Um bom natal para todos.
Mai
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Música: Caetano Veloso - Cajuína e Quereres - Maria Betânia. Baião malandro - Hamilton de Holanda
Imagem: Google
Por Sueli Maia (Mai) em
12/16/2009
Regressivos finais de um filme onde há um duelo entre os atores principais. Há piratas espalhados no cenário se escondendo por trás da fumaça dos gases letais. Figurantes vestidos de gelo estão a pingar, a brigar ou brincar com o que há de mais sério no mundo. Olha a claque: - Gravando! À deriva e devagar estamos todos no mesmo barco do degelo. Há vidas sangrando oceanos. Piratas singrando nos mares, espreitando tesouros que estarão fatalmente perdidos quando tudo terminar. Fatal mesmo é esquecer de lembrar que no epílogo da vida, do fim mudo restará uma pobreza plural. Estátuas de gelo começam a pingar lentamente. Magnatas-piratas e gigantes-pigmeus, por favor não esqueçam do instante irrevogável que começa no segundo primeiro, após o minuto final. 15...14...13... .
Imagem: Google
Por Sueli Maia (Mai) em
acordo climático,
aquecimento global e degelo,
Contos - Ficção
12/15/2009
.Não sei precisar quanto tempo, lembro apenas que estava desatenta quando tudo aconteceu. Sinto frio nas mãos e no estômago. Meus ossos estão frios e a pele gelatinosa. Sinto um medo estranho e fatal. Uma espécie de degelo escorre sobre minha cabeça. Foi tudo muito rápido. Coisa medonha de sentir. Um choque nas costas, um jato gelado contra o corpo ainda quente, fez parecer que me quebrara ao meio. Foi no pesadelo dessa noite que eu afoguei. Comigo estava muita gente, lixo e bichos boiando lentamente. Terror, ficção e agonia real. Um tsunami de horror e caos. A morte tem uma face perversa que se compraz com pesadelos em noites sem fim. Lembrei de gritar, mas o grito não saiu. Fiquei imóvel por um tempo, mas novamente o desespero de não acordar me assaltou. Há momentos de desesperança que exigem a coragem de permanecer, resistir. Então decidi esperar e porque minha voz não saia eu tentei respirar novamente, mas célere como um lince voando sobre a presa, o pesadelo me engoliu outra vez e a agonia me entrou boca adentro. Não consegui respirar e parei. Há momentos que são como a fome e a pobreza que parecem não ter fim e depois quem as vence se esquece. Mas há instantes de extrema impotência em que é preciso confiar e persistir porque resistir pode ser uma questão de vida ou morte. O tempo se esgota e exaure. Enquanto isto, eu sinto uma placa de gelo sob meus pés.
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Imagem Google
Música: Renato Russo - Mais uma vez
Por Sueli Maia (Mai) em
prosa
12/11/2009
A fala era fraca e desconexa, mas eu conseguia ouvir. E dizia baixinho:
- há menos gestos e mais silêncio nesse canto do mundo. Mudos; estão todos mudos; e surdos, tudo parece distante. Há menos gritos lançados, há dor a mais, e tudo é dorido se arde a pele, e tudo arde. Pois se um tecido suave encosta na pele que dói, tudo volta num instante.
Mas eu ainda quero vida, seguia quase a sussurrar: - É delicado tocar os cordões que sustentam as coisas, e entre as roupas estendidas nos varais e a brisa perfumada que desprende e se sente, há coisas que insistem em pender.
Hora de acertar ou se esconder.
Mas o mundo está super aquecido e as coisas se amornam enquanto corpos esfriam, e tudo no branco do frio é cinzento e lancina, não importa a estação, o trem ou os trilhos, porque entre os extremos de frio e calor há vida a menos e mais solidão.
Mas tudo cansa; e em suma o mundo está chato e mesmo assim é preciso viver chateado e sorrir.
Veias e vias, em cena acenos e mais despedidas às mãos. Onde havia calor há menos encontros, mais dor, e muito se renova no calor, mas o largo da dor se amplia e tudo requer serenidade.
[Amenos, pensei, sejamos amenos].
E nos extremos purgados nas latrinas, um opiáceo qualquer rebaixa a tensão.
[Mas afinal neste espelho sou eu?]
Logo ali a palavra seguia lenta, mãos trêmulas, inquietas...
E enquanto tênues, os cordonetes trançavam o espaço, eram vazios que pendiam nos cordéis cortinando roupas a secar com silêncio e solidão.
Vento suave na face, é o tempo erupindo o secreto.
Mas a alma cansada está calma enquanto eu estou aqui e sigo fingindo o que exaspera. Agora me resta a espera do que ao vento descortina em nus. E na agonia das roupas pendidas, tremulam os amenos cordéis.
Imagem: Google
Por Sueli Maia (Mai) em
12/10/2009
Há lugares intocados e tão fundamentais como as restingas onde a preservação se dá, justamente, pela falta de acesso do homem ou porque, ao redor, todo o mar é bravio e turvo. Acordei lentamente e sem voz. A garganta não dói mas ressente as horas seguidas sem nenhuma palavra vibrar. Quebrar o silêncio sem nada acrescentar ou dizer, é tão inútil quanto a lavagem compulsiva de mãos fora da lida, quando o que se tenta lavar não está nas mãos. Há restingas de nós e em nós e há silêncios tão necessários como as áreas restritas de restinga. Há lugares assim, abundantes. Há dias assim onde tudo além da natureza e do tempo é um lixo degradante e nocivo. É delicado caminhar sobre o que arde. Mas se o sagrado se contempla na hora exata do querer, a consciência só desperta quando queima uma chama e dói. Estou numa faixa de areia onde a vegetação toca o mar mas que pode acabar na elevação do nível dos oceanos.
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Imagem Google
Música: Mozart
Por Sueli Maia (Mai) em
12/09/2009
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Não havia lugar no mundo para onde tantos fixavam o olhar. Não havia lugar no mundo onde tão poucos se negavam a crer. E enquanto penetravam o interior das geleiras, o degelo inundava o planeta.
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Por Sueli Maia (Mai) em
12/08/2009
Dedicados companheiros numa estrada qualquer. E o vento batendo no rosto era ele era eu, era o tempo e a mais louca liberdade a nos guiar. Céu a nos proteger e o infinito éramos nós a nos perder em sorriso, no medo e coragem que eram aqueles aleatórios fractais que vinham e iam conosco na estrada. Ele era ainda um rapaz e eu o universo de nós dois a ouvr aquela canção. Olhos fechados e as luzes a surgir eram alegorias multicores que brilhavam e piscavam num céu que nos seguia em todas as curvas do caminho. Descaminhos a nos perseguir e quem me guiava era ele e imantado em meu abraço nós nos perdíamos de nós e em nós. A velocidade era o mergulho e a decolagem e aquilo tudo ainda hoje é muito grande porque em beleza, as imagens nunca se vão. E porque ouço esta mesma canção elas voltam. Ele era um menino e eu me vistia com seu corpo e o aquecia com meus braços. Dedicados companheiros são como vestes confortáveis sobre a pele. Roupa que mesmo velha se veste se despe e se guarda e acaricia porque fiel, ela se modela e se molda ao novo corpo que é sempre o mesmo na memória da roupa que guarda. Chamego que se tem e se quer bem porque retém o cheiro do tempo que vai e que volta toda vez que os olhos se fecham e a memória se despe e adormece em mais uma estação. Ele é um homem que eu guardo menino secreto no armário junto ao Jeans dedicado que eu não dou a mais ninguém.
Músicas: Patrick Watson - man like you e drifters
Por Sueli Maia (Mai) em
12/05/2009
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Pode ser! E agora estou aqui, encrespada e fervendo. E esta é uma onda sonora em difusão. Tudo bem, eu dancei, tô dançando. Mas agora estou numa balada qualquer e nessa frequência, em qualquer lugar que estejas, ouve essa música e vem dançar se quiseres também. Vem agitar com isso que usou e que bem abusou. Vai, larga tudo prá lá porque a vida é confusa mas difusa é essa tua tristeza que reverbera no tempo e no espaço e que só exacerba o cansaço de viver. Levanta! Porque obtuso é todo esse mundo entre o eu e o que não sei. Mas o sol também é sozinho e forte se ergue e se arregala todo dia e a cada dia raia em novo sorriso e em qualquer lugar do planeta há luz, novo dia, outro sol. Coragem! Deseja tudo de novo e outra vez e deseja qualquer coisa, mesmo que possa até nem conseguir, mas deseja! Porque afinal tudo na vida pode ser. Distorção entre graves e agudos e bem ali há uma palavra em desalinho que reflete esse silêncio dissonante. Se quase tudo pode ser é assim que eu danço, eu canto e deixo estar porque tudo pode ser. Mas... e se tudo aquilo for nada daquilo, porque e prá quê tanto frio doendo e os ossos quebrando assim? Porque esse nó na garganta? Eu poderia ter acostumado com tua ausência se a tua presença não fosse maior. Brincar com o impossível é isso. Porque o tempo corre e tudo corre enquanto muito ocorre e muito foge de nós. Há difusores buscando equilíbrio no desequilíbrio extremado. Há um quarto cheirando a lavanda e as paredes difundindo a gravidade ainda refletem bons sons equalizadamente. Mas não demora porque se tudo pode ser, pode até ser que amanhã eu nem esteja mais aqui, ou nem ai.
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Música:NSync - happy holidays, Tom Jobim, Zimbo Trio - chovendo na roseira
Chris Rea - driving home - Debussy - Reverie
Por Sueli Maia (Mai) em
12/02/2009
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Bebi mais que comi nos últimos dias, mas estou bem. Trânsfuga. Estou meio tonta e apenas o instinto me guia neste instante. Tateio. E tatuado em minha pele tu estás. Formigas apressadas trabalhando e aqui no oco da minha cabeça rascunho esta cartografia clichê de dezembros. Eu sei, sou piegas, esta seria a tua fala, eu não me importo. E mesmo assim é prá ti, pai, que eu escrevo neste instante. É que numa fotografia qualquer que encontrei, eu estou em teu colo. Teus olhos, tua barba, tua boca, teu sorriso me entrou como um mantra repetido em vibração. Idelével, eu entôo teu nome - te amo, pai. Tuas palavras ressoam em meus ouvidos, o cheiro da tua pele me desperta e tu estás sempre comigo. Creio em ti. E acho até que essa minha estranha mania de ter fé, vem do quanto te espero ou desse teu jeito estranho de me fazer acreditar nas coisas. Uma fé diferente que me arrepia os cabelos. Lembrei teus cabelos e em tudo tu estás. Eu te desperto em mim e sempre que estou em apuros te quero por perto. Acorda, levanta, te alegra, me manda um sinal, eu preciso de ti, eu me orgulho de ti e como sinto tua falta... Preciso te contar um segredo - é por ti que eu vivo. Não sei bem porque, mas meu corpo inteiro formiga agora. Vagueza é isto que sinto e porque incomodamente me faltas, é que neste instante cada fibra do meu corpo grita teu nome e hoje preciso dizer - te amo demais, meu pai. Escrever cartas é um estranho ritual que desperta coisas. E cada dia levantar é impulsão, necessidade e pés no chão. Mas junto contigo, o sol me adentrou a janela. Já é dezembro, pai. E na cartografia dessa minha saudade, sussurrar o teu nome e dizer que te amo, eu sei, é clichê.
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Por Sueli Maia (Mai) em
12/02/2009
Drops caindo no colo e outro - de anis, ardendo na língua. E o azar daquela moça foi assistir novamente aquele filme. E sonhou com a alegria de um banho de chuva e ouvindo os pingos da chuva ela dançava aquela música, tamborilando na vidraça. E acordou ouvindo baixinho uma criança a chorar. Era a mesma criança que sempre ela via, vendendo drops nas calçadas. A música ao fundo era a mesma, o ritmo entrecortado era o mesmo e era o mesmo, o espanto da moça que, no vinil, escutava o mesmo cantor. E era óbvio que ela ouviria o disco girar em silêncio. Mantinha a calma com a criança mas ela mesma, gritava por dentro ouvindo aquela canção, soluçar em replay. E existe um tipo de amor que não é o que sente uma mãe mas é uma espécie de amor que arrebata os humanos. Porque ver uma criança ferida chorando de medo, desperta a vontade de acolher, conter junto ao colo e baixinho cantar e fazer dormir e deixar sonhar... Queria a alegria daquela criança brincando na chuva, sorrindo com a chuva e na boca, um drops de anis...
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Imagem Google
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Por Sueli Maia (Mai) em
11/24/2009
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Sunday em domingo barulhento derretendo ao sol. Tumulto na areia. Praia e supersônicos silenciosos no céu, rasgam a monotonia desses tempos e uma nova semana convida à alegria. Hinos que eu canto. Tiss e mais um tiss e o cuidado com a onda. Tiss é o som do lacre rompido saciando as sedes. Sigmas sibilam no ar estes múltiplos esses. Os Sssssss supersônicos ensurdecem. Mas a alegria é barulhenta, é uma menina indiscreta, moleca catando latinha na areia a brincar com o gari, bem ali outra lata a luzir. E todo corpo a bronzear brilha ao sol e os dentes reluzem em gritos de gol. São brilhantes os artilheiros e eu sorrio com o sol. Times são signos do desporto a flamular suas insígnias. Isto significa mais uma vitória e outro tiss a hidratar as bocas. Loiras a escorrer. Escudos em toalhas e sungas desfilam na areia. Domingueiras em tardes peladas e na praia há corpos expostos à camada de ozônio e uma cambada assovia sob óculos escuros. Espio e percebo beliscões em ais às coxas. Ui...E neste domingo fez sol e calor. Sundays resfriando cabeças. Insolação pede filtro. À sede um suco ou água de côco. Ciúme incendeia e água apaga incêndio. Sombra a esfriar os pés na areia. Réstia de medalhas e troféu que se ergueu. Restos de ontem que eu sibilo e silabo neste texto. E o meu assovio moleque modulou na acústica, so I cried. Ecos propagados em feixes e captados no radar. Um domingo e uma garganta, supersônicos em SOS. Gritos há muito calados são melodias que hoje o silêncio protege e novamente, monday.
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Música:
Lulu Santos, Jorge Ben Jor, Tim Maia
Por Sueli Maia (Mai) em
11/18/2009
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Ocultos pecados capitais. Pequenos delitos culinários são deleites das línguas e tudo é pura sedução. Imagine. A frigideira é uma cama com pedacinhos de manteiga a derreter. Quente. E a manteiga escorrega lentamente até dourar em fina espuma. Nus. São filés de trutas banhadas por mãos em fio de água pura e corrente. Rente a frágil carne está aqui em minhas mãos e suavemente aperto os filés. Água a escoar sem descuidar de deixar húmidos os filés. E hoje salivam aqui, os deleites de trutas. Nada mais que deitar filés em cama doura de manteiga e depois salpicar-lhes sabores a gosto. Pares. Virar-lhe o dorso quando tudo soltar livremente. Perfeito! E neste lado novamente deixar ficar. Reservar e agora o deleite. É um molho de queijo que serve como base a tudo. Hummm... Banhos de leite com fio de azeite são brancos lençóis madrigais e o leite se incorpa aos queijos. Cream Cheese. Poeira de noz moscada no ar, aroma dos deuses e agora é mexer lentamente. Rebolar os pedaços de queijo, requeijão no leite com creme de leite sem soro e tudo dança que dança, até engrossar com colheres de fina farinha de mesa. Mandioca é gostosura natural que entra na dança enquanto o mundo gira na panela com queijos ralados na hora. Sabores das línguas, e acrescente o que quiser, como alcaparras, castanhas piladas, salmão e jogue tudo por cima. Lençóis em delícias. E ali sobre a mesa, bocas, filés e aromas e trutas em puro deleite. Amores à mesa e hummm... Mas Shhhh...agora imagine o seu.
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Por Sueli Maia (Mai) em
11/17/2009
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Dias passam intradérmicos e agitados e quando é noite tudo se amplia e um dia indormido vira noite. A insônia é rebeldia que traveste-se de tudo o que quer. Assombro-me com uma pluma que cai e incorporada embebedo-me de nós. Alucino-te e a teus cabelos. E já não domino o medo de ver-te em tudo que não há neste mundo. Alma de outro mundo vai-te embora e vê se me erra! Tu és errante, eu não, e agora minto. E, sobretudo porque o natural seria tudo acabar de uma vez e ao final nada mais que um punhado de pó e poeira restar, eu não cria ser possível perceber-te novamente. Mas és tu aqui, essa presença incorpórea a me atormentar. E há tanta chuva e cheiros no ar que uma débil luz forma um halo e tu me apareces perfeito. És aura em sutil movimento. Leve, és lento ao mover-te e tudo no entorno é sobrenatural. Pluma planeando ao redor. E se não sou eu, o que é tudo isto que é um não querer de um querer inumano? Me obrigas a acender sob a pele, reacendes-me silente e inflamável te riscas e atiças uma chama qualquer. És tu que em segundos a tudo irrompes e num raio imenso de nada, tudo é só devastação. Tempo é poeira e eternidade. E quando se perde e se insiste em não abandonar, tudo incrusta na pele. Memórias da pele onde tudo se imanta. Manta de amantes tem imã de lã em infinitos sobrenaturais. E um perfume toca a língua e se transmuta em puro sabor e pele etérea tem sabor e calor de presença corporal. E nada é frio ao incorporal e neste agora inconfundível, és calor e chama. Meu peito se inflama e como nunca és sempre. Espaço vazio de pleno que faz desse sempre um tempo fugaz. Vai e já vais tarde como pluma no espaço. Dança na solidão que me deixaste e vai mais além que o nada mais, porque entre arrepios e a sede, eu sei, hoje psicografarei esta tua presença. E se em tudo estás, olho ao redor e não hás. Nada além da insurgência de coisas e o vazio se precipita organicamente. Projeções no ecrã. E o cosmo se move aqui, moras em mim, visceral. Mistérios de fogueira que crispa e num tempo que cabe em punhado, há suor em minhas mãos e tu não te destróis por castigo. És um castigo e minha pele ainda sofre a intuir que há presença e estás aqui e tudo dispara os sentidos e nada se vê. Olhares bem perto e eu te respiro ofegante. Um frio na espinha e há signos espalhados por toda parte incitam, te evocam nesta ausência com a qual te fazes presente neste sempre de infinitos sobrenaturais. Coisas da fé ou de não tê-la. Shhhhh... há vozes e agora é teu nome que ouço baixinho e estás aqui dentro de mim. Sussurro morrendo de medo, mas vai de uma vez, ascende agora, eu preciso dormir!
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Música: Trouble - Coldplay e diversos
Imagem: Google
Por Sueli Maia (Mai) em
11/15/2009
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Escrevo na pele em yorubá a dúpé - eu direi - África. E a África fica em tudo. Nas veias circula sangue em rios de africanidades. Ê Zumbi! Tambores em ritos e gritos de gentes e bichos das matas. Sonoridades d'África. Orixás, sincretismo em congás. Benzedeira rezando quebranto e guiné prá quebrar a mandinga. Púrpura. Uma figa de cedro e guiné prá abolir os seus medos e abrir seus caminhos. Alforria! Sorria com os marfins e Gnus em nações. Ao redor desta terra um Brasil com raizes e mãos africanas em tudo. Angola. Ah! Luanda é tão linda de se ver. Melanina é força a proteger a pele que brilha por si. Negritude. Tudo repercute em sons e alegria. Sorriso e dança com um remelexo que encaixa os corpos suados. Jambo e malemolência ritima a kizomba. Ginga é Jogar capoeira e gritar liberdade. Coragem de lutar. Oiço vozes e raízes da ancestralidade. Dendê é esse cheiro com fogo na língua. Quente é um acarajé. Negra face e um sorriso perfeito. Aff! Como é bela essa moça que dança com trança. Pixaim é o cabelo. Moçambique, alambique tem cheiro e sabor que arde da cana, na cama. Ruanda, muamba é só uma rima. E na panela de barro a galinha d'angola é à cabidela e põe a ferver. Há mais, muito mais, forte e quente nesse tudo que é um pouco do muito que da África fica, aqui.
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Imagem: google
Música: The circle of life
E songs of África
Por Sueli Maia (Mai) em
11/12/2009
.Impulsos oníricos a lhe perturbar e os feixes de luz que saiam dos olhos encandeavam os seus. Não era humano aquilo, mas como suava aquela cristã! Mouros. Ou seriam lobos da andaluzia? Noturnos assaltos que de tão surreal confundiam os sentidos. Mordiscava de medo os lábios, mas aquela invasão mourisca, era tudo de bom. E entregue se perdia. Restava inerte de tanto querer e nem queria acordar ou gritar por socorro. Corria nas ruas da Andaluzia e aquilo era tudo um sonho mas haviam lobos e os mouros a invadir a janela. Selvagens aromas lembrando Servilha. E tudo servia e suava, mas não havera de correr naquela noite. E tudo estava tão bom que fingia dormir com um olho aberto mas queria bem mais. Ao longe os sons da percussão encobriam seus uis. Granada. Guitarra flamenca e as platinelas arábicas davam o toque andaluz. Breu. Tudo ali era tatil e os cheiros da noite aguçavam os sentidos. Cravo, canela, baunilha, ou seria Channel? Intuição. Aquilo tudo era a pele e a seda da flor. E na fruição de quereres, seus uis reforçavam aquela selvageria mourisca. Arisca era aquela mulher que da periferia se arriscava a colear sob os lençóis. Silêncio por fim e enfim, uma estranha mutação. E a devota cristã restou-se pagã e feroz, correndo com os lobos na periferia.
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música: Andaluz - Djavan
Imagem:Google
Por Sueli Maia (Mai) em
11/11/2009
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Dia de acordar indolente e simplesmente espreguiçar, bocejar, e espiar sobre teu ombro. Que fazes agora? Espio. São tuas mãos que dedilham pianíssimo. Quisera tê-las. Te exploro; percorro teu corpo, tuas fomes e nesta desatenção eu respiro teu cheiro e essa nuca instiga a pudica menina a desabotoar-se dos recatos. Cato e toco tua boca e contorno teus lábios e essa memória me eriça os pelos e as peles parecem uma fruta de conde. Lembrei dos castelos. E há dias de erguer-se sobre o olhar de perto e ir longe. Hoje é desses dias em que se é o próprio dia e apenas olhar ou lembrar não sacia. Tátil. Tocar tua pele apetece romance. Lance. Pura lã é teu corpo que inteiro, esquadrinho, persigo e conspiro. E a ti me dedico, tateando o teu território e tuas vastidões. Boca que é minha e que seca sedenta, pedindo licores. Águas, braços de rios a caminho do mar ou além e mais além d’além mar. E tudo se expande e contrai. Minho, vinho, é um ninho este sonho que em meu peito se demora. Moro em ti e aqui há ritmos de se ouvir e dançar e depois uma explosão escutar. Mas no após quando é bom se acalmar em silêncio e aninhar em abraço, morarás em mim. Compasso de esperar enquanto cai esta chuva, lá fora e aqui. Corporais. Esta é a explícita sincronia dos amantes que fica no ar e que aqui deitará. Esta presença que fica sem ir, sempre está. Memória do teu corpo no meu e mesmo se fores ou não, ficarás.
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Por Sueli Maia (Mai) em
11/10/2009
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Imã é o teu olhar que me abriga neste instante. E o mundo inteiro estava em teus olhos e mais que tudo eras um vórtice que me prendia aos teus braços. Hipnos. E tua pele era lã que em mim roçava e ao meu olhar se derretia em desejo. Magnética é a força deste olhar que hoje está e que impressiona minha memória e os meus sentidos. Olhos a me penetrar e em qualquer direção havias tu, aqui e ali que só de lembrar a minha força se expandia e em ti eu me fundia como um amálgama de não se perder. Magna era a linguagem do teu corpo a imantar os nus. E um universo carregado de sentidos permanecia em nossas peles. O teu olhar espelha o meu, que a te pedir insaciado, amalgama um sorriso luzindo com o teu. No ar a fusão do teu cheiro em minha pele e tudo espraia nós dois. Sonho e verdade condensando desejo e mistério e eis aqui a espera por mais vida que parece não ter pressa pois sabe que dia haverá de chegar. Imã é teu olhar que é meu presente e memória a nos imantar, ontem, hoje, sempre.
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Por Sueli Maia (Mai) em
11/10/2009
Segundos são noites eternas e nós estamos deitados por segundos nas bocas nascentes das águas dos igarapés e águas são zonas de amar. E por vezes fomos noites que em segundos sussurramos desejos eternos às águas e mansinha e imersa, prá sempre, estive em teu rio que - noite - banhou-se em minhas águas segundos sem fim. Noite, sou pedra e, nua, me deito nos braços de um rio que roça-me as ancas e, rolando, escorro e escoo minhas águas em suas águas ao encontro do mar - oceanos em noite. Segundos dormimos em águas saciadas em bocas da noite, abraçados por braços de um rio de águas quentes que inundou uma gruta e um feixe da luz de um luar penetrou-me em sorriso. Eu - pedra e noite - desfaço-me agora em mil olhos d’água ebulindo, eclodindo minhas águas que rompem a areia em segundos. Noite, seremos nascentes perenes por infindos segundos. .
Imagem Google
Por Sueli Maia (Mai) em
11/09/2009
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Noviços rebeldes em tempos modernos, também. Hoje verso a primavera brasileira e os festivais dos anos rebeldes. Poetas bravios versando com flores os ditos e as cores da bandeira nacional. Rebeldes e as dores do mundo. Ora direi e também cantarei os cravos de abril dum ano qualquer. E prá não dizer que não falei das flores, versarei à Flora e Yasmin. Lembrei Gandhi e o sal dessa terra. E por vezes estar liberto é deixar-se quedar sem quebrar seus ideais e ossos, também. E houve um dos heróis nacionais que escreveu que derrotas tinham gosto de vitória por não se vender ou estar ao lado de alguém em quem não se confia. Prosseguir porque navegar e viver é preciso também. Mente dura e um tenro coração, Luther King falou. Há rebeldes que ditaram um tempo e deitaram numa cama a vadear e amar. Lennon vive e Mandela também e há atos sem balas ou gestos violentos que calam platéias. E no cenário nacional há o frágil que é forte àquilo que precisa ser preservado. Quadros da atualidade, natureza morta e calmas Marinas a se contemplar. Ouví Hendrix no youtube e ainda me arrepio com seu solo. Nada fazer também é uma forma de lutar. E ao pescador o seu peixe, inteiro e sem dilacerar. Há rios rebeldes, também. Lumiar e o encontro das águas. Porque há rios com corredeiras e mistérios, com trutas ariscas e rebeldes a pescar e depois saborear. Vi alguém que lembrou Kerouac na estrada. Todo mundo foi ou é rebelde e um dia quis dominar alguém. Mas liberdade sem luta pode ser simplesmente ouvir o que se quer, quando e com quem se quer bem. Beatles, soul, jazz ou new age mas também o Tim Maia ou o maestro Jobim. Meu cabelo tem raiz africana, eu sou índia brasileira e rebelde, também.
.Música: Primavera - Santana
Imagem Google
Fotografia encontro das águas - Lumiar - Friburgo
Por Sueli Maia (Mai) em
11/05/2009
Mandalas populares. Passarela da modernidade é um desfile da palavra em elegância poliglota. Idiomas à solto nas línguas, tudo igual e bem up to date - condomínios. Ditaduras com domínio pelo mundo. - Fala sério, meu chapa, isso é mod e eu sou fashion, sou autêntica e tou na mídia. Ilimites de um show nas novelas sem limites. In or out, black or white tudo é cor, simples tom e os mosaicos modernos são plurais e singulares. Equilíbrio de tons, tolerância. Olha a moda reeditada e ditando o mundo - old or new? Fashion week. Ditadores gritando na mídia - black is beautiful, joga pedra! Zeppelin tá no céu e o morim é um padrão popular na avenida. Tô vendida, very cheap! É um marketing global. Animal! Linha branca e eu sou sempre do contra. Tô na onda, Black sheep. Macramê – tudo feito por mãos artesãs com uma manga raglan e uma saia evazé. Ao emule um bom som nacional e um DJ vai usando o velho vinil. Mocassim aos meus pés, transição de costume é um padrão - sou high tech. Aimoré na edição do pasquim, Hollywood, o distrito é aqui e o barraco também. Geração tolerância com in é outside. No youtube, linha branca é tão demodé. Ar blasé e um juiz faz login, por favor, dá um play que eu sou emo e contrasto na cor. Tudo é clean e está sóbrio demais. Solta um vírus, manda tudo pro espaço! Tafetá, ulálá! Etiqueta. Finos panos, alvas nuvens e um vestido de noiva é um sonho fairytale. E entre o soul e o hard eu sou basicamente diferente e igual. Baixa o tom, desliga o som, apaga a luz. Tá na hora, quem sou eu e onde estou? .
Arte: Tonho Oliveira
Música: Pierre Bensusan e
mosaico musical
Por Sueli Maia (Mai) em
11/03/2009
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De perto e de longe as idéias de um homem podem estar na vanguarda de um tempo. Harmonia em tons de azul de um dia qualquer. Ouço um blues, uso um jeans que é um legítimo índigo do alemão levi's que não é o Lévi-Strauss de quem falo. Mas o meu pensamento selvagem transborda na hora do rush. Meu estresse é grafado em tupi-guarani e espanto ouvindo uma valsa de Strauss. Lévi-Strauss é o nome de um homem que pensava o homem e mitos das tribos e ritos de sonacirema que escrevo invertido e leio ao contrário. Yeah! Você viu na TV que o homem é o mesmo, ontem e hoje nas tribos ou nas universidades? É porque a mente selvagem dormita junto à civilizada. Verso hoje um poema pequeno e diferente porque não faço versos, hoje faço silêncio e um blues para um centenário que vive.
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Por Sueli Maia (Mai) em
11/03/2009
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Littera e amarras. Linhas onde escrevo o que gosto. E este alinhavo de escrita é o gozar de uma verdade. Gaudium cum veritate. Ao tribunal eu me declaro - sou Inocência. E inocente eu faço arte irreverente. Porque meu nome é Inocência da Silva, simplesmente. Ao inclemente eu mesmo afirmo, não sou Irene, não dou risada. Volto a dizer não sou nociva ou libertina, sou inocente. Minha inocência é a palavra e a verdade que - inocentemente - aqui escrevo. E no que eu sopro eu sei de cor o que não sou. A minha aldeia é minha Polis genesíaca. Esta poesia de nascença sou eu mesmo e o infinito que não vejo, eu sou, também. Na tessitura desse verbo eu sopro idéia - Paidéia. E, arriégua! Eu sopro tudo o que eu quiser. Eu sopro ao vento e sobre as tribos sopro a arte dos meus versos. Não sou um verbo ou uma verba. Eu sou eu mesmo e, imagine, eu estou sendo. Verso sem sílabas, poemo verbo e sou poesia em pé de vento e ao pé da letra sou cio da terra. Cio da memória do meu mundo, sou feixe e mó. Constelação. Apenas Uma. Eu sou só uma, mas eu sou UNA e o meu umbigo está no chão da minha terra e aqui - em mim - há outra ponta. Sou só um grão e minha terra é meu umbigo, meu torreão. Hoje estou eu, pois ontem eu fui. E nisto o tudo ou o nada que amanhã, eu, só, serei. Saudade muita. E hoje eu sei, sou Inocência. Este é meu nome. Depois do gozo, o riso e, novamente, a lágrima e a solidão. Este é o orgasmo da palavra e da verdade. Eu sou, só eu e a corda, eu desamarro. Então acorda! Há tempo ainda.
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Imagem Google
Música: Djavan
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/31/2009
Olha o trenzinho do caipira, uma famosa brasília e no meio da praça, um vendedor de laranjas, meus olhos atentos, a escolha e o ponteio. Era um era dois era cem e olha o laranja sem graça e o que vale é que, sem trapaça, na praça ainda tem aquele vendedor de Laranjinha doce - quem vai querer comprar laranja? - Ele grita: - olha o fruto da terra que eu garanto é seleta e escolha sem pressa que eu descasco prá você. Não é de mentira é dulcíssima, repare na cor e sinta o cheiro do que é bom. Cuidado com o sumo da casca nos olhos que arde feito pimenta que nos olhos dos outros é refresco. Mas prove esta laranja natural, um autêntico refresco e deixe o sabor se espalhar. Quer saborear? É tão suculenta que escorre na boca um sumo de muito valor que dá gosto provar e comprar, não tem preço esse mimo do céu que, honestamente é boa porque eu escolhi como se fosse para mim. Olha a laranjinha doce, senhoras e senhores é uma laranja de verdade. Olha um, olha dois, olha cem pregoeiros de valor. E em princípio era um trenzinho caipira e quem vai querer comprar laranjas? E quem tem mais valor? Eu ponteio.
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Música:
Hamilton de Holanda - Trenzinho Caipira, Ponteio, outros
Almir Sater: Luzeiro
Por Sueli Maia (Mai) em
10/29/2009
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Genesis, babel. Manchetes de um jornal e ninguém mais se entende no mundo ou na mídia. Media e um pão com manteiga. Por favor, baixe o tom pois eu ouço em alto e bom som. É o gorjeio de um pássaro, ele twitta e eu paro prá ler a manchete mas ouço um twitt! É um pardal com o seu chirp! Pressas da modernidade, tudo é fast e meu breakfast foi uma media e um pão com manteiga. Nas palmeiras da terra brasilis, um sabiá canta alto e parece que tem um twitter na goela. GO! Ela vai é uma fera e eu ouço assovios prá ela e não dou nenhum pio. E somos modernos, mas ainda escrevo e posto com selo em correios, por puro capricho. Bicho do mato acanhado, durmo em redes e fui para a rede twitter pescar. Tanta língua se fala por lá... Eu li - ich brauche mehr, e o que eu posso fazer em alemão? É babel! Dou-te o céu. Mas por lá, 140 caracteres – é o limite! Ora se eu canto e esbanjo palavra, ainda sou estrangeira de mim... Mas aqui não é o twitter, não preciso ser concisa com minhas bobagens. Psssiu... Já ouviu o twitt?
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Música: Across the universe
Por Sueli Maia (Mai) em
A minha filha Elis,
uma índia morena com olhos de jabuticaba.
10/26/2009
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Primavera sem guerras na serra e diante das águas paradas do lago havia peixes, vida, festa e um menino feliz. Caio. Joelhos ralados diante de uma árvore. Esferas negras agarradas ao tronco são frutas que lembram os olhos das índias do amazonas. Até o topo se espalhavam sobre os galhos. Eram firmes como um olhar apaixonado mirando a boca que quer, quando a boca quer doce. Doces e miúdas eram brilhantes como os olhos de quem ama. E quando se ama há sorriso nos olhos e os olhos sorriem aos que amam. E toda coragem e destemor pode levar a fraturas ou morte. Flor do Lácio de Bilac, ora direi que aos olhos, bocas e também aos prazeres da alma há de haver dias de glórias, delícias e diabruras. Então pensei no prazer da conquista, lembrei-me de Hemingway e da última flor que amava Bilac. Bruta menina e miúda sou eu. E lembrei-me do olhar de uma índia que conheço e que, sem qualquer sacrifício, eu amo. Lembrei-me do sentido da vida e que viver aquela glória estava agora em minhas mãos. Mas eu estava apenas diante de um pé de jabuticabas. Uma menina diante de um menino com vontade de, livremente, chupar jabuticabas. Subi. Ser feliz é ser você simplesmente um segundo. Mas filosofar enquanto se está a colher frutos é impróprio. Eu não recomendo. Você pode cair. Caio novamente. Desta vez a ordem era subir e saborear o doce sabor das frutas colhidas no pé. Índias esquecem a dor facilmente. Eu aprendi com ela e esqueci os joelhos, olhei para o alto e respirei uma vida distante da guerra. Jabuticabas aos montes. Então guardei estas para Hemingway e para quem mais quiser, a safra está boa. Música: Miss Sarajevo
Imagem Google
Por Sueli Maia (Mai) em
10/26/2009
Deixar o chalet e a calçada prá ver natureza e estrada de chão. Brincar de criança no tempo, vestir power ranger, caçar liberdade e coragem. Ir de motocicleta ou de bicicleta ao mato, sem medo e com o vento soprando uma lógica a favor de um pavio. Desertos e curvas de mim, uma serra e um mar.
Entre eu e o mar, um mundo, um caos e um cais. Quebrar a palavra, o medo e a ordem, com o vento soprando na cara a memória de tudo que sou. É bom procurar e achar outra vez a coragem e a força de dentro. Assombro é miragem que passa com pressa nas sombras das curvas da estrada. Se eu paro e encaro de frente percebo: são copas apenas, aqueles fantasmas. São nada. São árvores, mais nada, por isto não há nada a temer.
O céu desce ao chão, a serra no mar e eu piso à areia. E pego na mão um punhado de areia e solto um punhado de medo em pó e poeira. Coragem é criança que vive - lá dentro - um dia de cada vez. Caio. Mas esta palavra não dói, este nome é alegria, um sol que dorme na serra e a luz, vai de volta prá casa.
Cuidar do joelho e do braço arranhado, nem dói. Porque ela - a alma - é puro algodão e a pressa está calma aqui dentro de mim.
Música: Cais
Fotografia: Sueli Maia
Texto reeditado
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/21/2009
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Ilhéus. Eita tempo medonho que dá arrepio e não se sabe de que. Millennium é uma ilha remota, um atol do Pacífico mas lá não há medo. Medo é o pesadelo do milênio, é um nada poderoso que se esconde com um olhar arregalado. É um vulto que espreita e nunca aparece mas reaparece em todo lugar. E tudo se mexe, assusta e persegue o que fica encolhido. O medo é um covarde que gosta de apavorar quem está só, quando se está só. Medo é a boca de um gigante com fome. É o frio de um alpinista solitário. É o monte aconcágua prá uma formiga. E quando uma só folha cai, arranhando o silêncio, o medo é o bastante para um grito que rasga o espaço feito bala assustando o silêncio mortal. Então o homem, sem voz, grita por socorro com as mãos, o olhar, o pavor e por favor, alguém acode esse homem! Terreno baldio é esta vida, e o medo é o atravessar no escuro um abismo, com nada por baixo e o escuro esconde tudo e nada se vê. A vontade é correr e tudo é pavor. Assovio de vento é fantasma que ri. Coruja que é ave de mau agouro chamando a morte e meu deus, quem vai morrer? Medo é um buraco acima do umbigo, do tamanho da fome do mundo que nada engole e vomita o mundo. E ninguém engole a fome do mundo. Ilhéus do milênio num tempo esquisito que dá arrepio mas não se sabe de que. Calma, você tem medo de quê?
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/19/2009
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Dia branco de se enroscar sob a coberta. Fruta mordida. E a distância distorce o que vê. A injustiça é um espelho vaidoso que estilhaça uma face real em mil pedaços. E tudo se inverte no espelho. O miudo fica grande como um trem parado na velha estação e o outro se apequena e se dissolve feito fruta espremida que escorre em sumo secreto que só se serve em despedidas. Estava na rede acordado e mudo. Tentava fingir o que seria depois de beber o sumo deste dia. Por certo estaria com sede. Ele sempre tem a sede dos desertos. Então preparei-lhe o sumo servido ao mais belo deus do olimpo, que era secreto. Jambo dulcíssimo, vermelho e carnudo. Água adocicada de um côco verde com a polpa picada e batida, tres gomos de tangerina sem pele e gelo que agito, até espumar. Aroma delicado e estimulante, servido em fina taça como um ritual dionísico. Estonteante! E se mortos não movem a face, abriu os olhos e os brancos dentes e antes de se despedir, sorriu, bebeu e satisfeito levou a suave lembrança do sumo. E após o frio dia branco saiu da rede e seguiu. Tudo que fizer que seja feito com amor.
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Imagem: Google
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/16/2009
No viço de um dia espreguiça e acorda com o sol. Sol. Luz de um olho só e uma boca boceja seu viço de cara pro sol. Noviço com vício e preguiça, que prá acordar e despertar ele se espicha e espreguiça, entregando pro sol todo seu viço noviço e iça, o som de um espanto e espanta a preguiça. Prá cima e pros lados espicha e alonga os braços. É um dia acordado com viço. Alonga esse dia que é novo e é bom. Bom acordar e ser dia. Sentir esse dia noviço com gosto de noite ainda na boca. Olhar esse dia e cheirar as manhãs nos seus braços. Abraços. Na boca da noite ainda tem dia. Deitar com a noite bem tarde e enroscar o cansaço de um dia. Bom dia e boa noite, noviço.
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/15/2009
Rascunho mais do que escrevo seriamente. Escrevo rascunhos e pesco palavras com vida, na vida que a palavra me dá. Pescar é ísca é rede é peixe é mar, mansuetude e paz. Palavras tem aroma, sabores das línguas. Ah! Mar! Gostas de peixe? Sou simples, gosto de ir sendo. Se eu sei, digo que não sei e inversamente, quase pouco sei. Na dúvida eu quero o afeto. O amor que cresce, acresce-me em paz. Eu amo gente e guio-me na vida e na alegria de viver a minha humanidade. Eu amo a vida e amo o mar, vou conduz_indo em correnteza, eu vou. Fio condutor, dou linha. Daquilo que posso e tenho bastante, eu dou. E aquele que não sabe amar, não consegue dar. Só ama o amor que a si é dado. Não ama quem o ama, só ama o amor, daquele que dá. Na rede cega de certezas, há desamares. Em não amar, vacilos incertos e não há peixe nessas redes. Quero-me incompleta, curiosa e viva, pulsando. Peixe pulando, não quero-me erudita. Quero ver tudo nesta vida e saber tudo que não sei. Eu nada sei. Eu nado. Sou peixe com escamas. Sou oceano e peço: - pesca-me? E porque amo, dissolvo-me em palavras e sigo a correnteza sem pressa, vou nas ondas do meu mar de amar... Vejo-me em teus olhos e sinto o céu em tua boca. Em ti encontro a minha loucidez e a luz. Iça-me os lábios, olhos, boca... Fisga-me, segura-me em tuas mãos... E ainda que eu lute e me debata, íça-me, saboreia-me em teus braços... Gostas de peixe? .
Fotografia SMaia
Por Sueli Maia (Mai) em
10/15/2009
Dançar ou escrever, eis a questão. Eis que a música é porta aberta e pé na estrada e eu, viajando em arabesco, não vou dormir, prá que roncar? Talvez sonhar. Ela pensava - o que é mais nobre, um conventilho ou ir com vento à um bordel? Não há ofélia afogada desafinando em tom pastel. Não cantarei com o fantasma aquela ópera. Eu dançarei, está decidido! Escreverei palavra incerta e neste ensaio dançarei com Hamlet e citarei a minha insanidade. Porque morrer é só uma peça com dois atos. Se eu viajar posso voltar ou não voltar. Eis a questão - Serei, por não estar ou não serei por simples ser em meu estar? Onde enfiar todos os sonhos se o acaso me assaltar sem paraquedas nesta vida? - Meu hamlet, dá-me o prazer de ser meu par em uma dança? Eis a questão. Ser ou não ser menos que um par e mais que um ente, um ser humano? Escrevo palavras difíceis porque me roubaram o tempo. Dou mais um tempo à palavra e ao papel. Neste papel eu serei hamlet ou ofélia? Estou in_quieta pela estréia. Não sinto dor naquele d'ente que eu não tinha. Eu quero um doce escorrendo em minha boca. É doce o mel e o colo. Sem meu colar, dá-me teu colo? Boa questão. Se do guerreiro a esperança, eu sou o molde da etiqueta e da elegância. Estou guardada em meu vestido, semi-aberto e transparente. Iniludível a escolha nesse vôo do pardal. Voar ou não voar? E o que é mais nobre para a alma – ser ou não ser, enlouquecer ou explodir com todo mundo? .
Dança: Grupo Corpo
Música : Arabesque 1 Debussy
Texto reeditado
Por Sueli Maia (Mai) em
10/14/2009
Aquela verdade era um olho de vidro com dois cílios postiços e unhas de nylon sem cor. Ela era em sapé com as fomes e sedes bem naturais. Maria do Amparo era noite de chuva nos olhos do céu. Sentava na sala na insônia do quarto crescente sem luas de mel. Do ausente lembrava porque só queria esquecer. Num outono dormindo acordada sonhou que bebia um amor numa cena de safra madura da adega. Vinho íntimo em taça ele lhe serviu e ela o provou. Serviu os nus. Pediu: sorve-me? E baixinho a lareira sorriu e de novo pediu: - acende-me? Meu calor e meus nus aquecerá o bastante nós dois. E Maria do Amparo acordou com os cílios postiços nos olhos de água e com as unhas de nylon cortadas, na palma da mão.
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Imagem Google
Música: No Woman no cry
Reedição
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/13/2009
Prá que serve o que eu sei
se eu não sei prá que serve
o que eu sei?
q
u
e
d
a
r
a palavra
sub A L terna
terna palavra
Por Sueli Maia (Mai) em
10/11/2009
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Claras. Transparência. Branco e neve, suspiros desmanchando nas línguas. Contraste de opostos é o que provo e provoco sendo clara neste instante. Teia de palavras onde a sombra é parte de tudo. E parte de tudo que é sombra é luz que faz clara a sombra. Serei clara como a luz silenciosa das manhãs, rompendo no escuro um dia qualquer. Lembrei de você e hoje decidi ser mais clara. Suspiros! Quis escrever. Enquanto o branco subia em neve eu percebi como crescem as coisas que se bate intensamente. Percebi o incomum. Não se destrói o que se bate intensamente. Tudo que se bate intensamente, cresce. A arte de fazer crescer neve de claras está no bater intenso. E quando guardada no escuro e sem movimento, o que é sombra cresce mais e mais cresce no escuro a sombra. E porque não se esclarece o obscuro, ele cresce sem ser claro. Por favor, não me julgue sem que eu possa esclarecer e dizer o que quis dizer com uma palavra ou outra. Claras são as manhãs ao som de clarinetas e, por favor, não esqueça, lembrei de você com os suspiros desmanchando na língua. Sou confusa no meu caos e preciso ser clara, mais clara do que sou. É incrível, mas em tudo vejo luz silenciosa e por mais singela e clara o primordial é que a luz está ali, chegando devagar como os suspiros feitos de claras que em neve e dourados no forno, derretem agora nas línguas, que degustam em suspiros...
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/09/2009
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Espaço de circulação e fluindo entre os dentes, o sorriso é uma idéia genial. E na contra mão da arte, esta arte é a verdade de um homem sem dentes. É expansão. Moeda retida - sem circulação - ocupando os espaços é a contra mão da expansão. Expansão e ocupação dos espaços vazios é apenas um lado da moeda. É um lugar de moeda e planejamento. E sem planejamento, um lugar, não serve à expansão e nem à expansão de um sorriso. E por outro lado a expansão do sorriso é arte que não tem lugar. É o desenvolvimento de um pensamento estético da arte que fica no vazio da beleza atual, mas que não é real. E na realidade - a arte - é o retrato da realidade da vida e do homem em seu natural. E realidade da vida é o que vivemos. E aquilo que somos vivemos. E com o que temos vivemos. E podemos viver em espaços imensos que ficam pequenos porque coisas se acumulam. Dentes falsos ocupam as bocas que ficam esteticamente perfeitas e sem riso. Função do sorriso. Mas nos espaços se amontoa tanta coisa sem função. E há tanta coisa sem função nos espaços pequenos. Ar. Espaços pequenos sem ar. E o sorriso banguela na tela é beleza natural, alegria real que se vê no olhar e na boca sem dentes. Homem natural e a estética perfeita de um sorriso verdadeiro estampado na tela, é o espaço vazio entre os dentes e apesar do trincar de outros dentes esteticamente perfeitos, o sorriso banguela é verdadeiro e feliz. Coisas amontoam os espaços e espaços ocupados com coisas, desordenam cidades. E nós precisamos de espaço. E há espaços de livros e há livro demais nos espaços e Deus me livre! Há livro do qual não me livro e nem quero me livrar. Mas há coisas mais úteis que as coisas inúteis em livros e há falsas verdades em livros. Livrai-nos! E de todas as tralhas que estão prontas prá desabar em cima do mundo amontoado de tudo, livrai-nos! E não há mais lugar prá correr nos espaços sem ar. Circular. Há coisas que impedem de o ar circular. E quanto tempo e espaço teremos para termos mais espaço e tempo para nós e não para as coisas que amontoamos nos espaços e o que nós podemos fazer para a expansão dos espaços vazios?
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Arte: Caio Fernandes - Acrílico sobre tela
Por Sueli Maia (Mai) em
10/06/2009
Mas o tempo é sempre o mesmo, ele é um só.
Um sol que se derrama a cada dia.
É que o tempo não diz, mas o que muda
é apenas a hora de compreender, viver e só então ensinar.
Sueli Maia
Estela é uma estrela e diariamente ela chega ou volta com o sol. Abre portas, cortinas, janelas e depois muda a roupa e vive prá ganhar mais um dia seu pão. Estela sorri, abre os braços, as caixas guardadas, vasculha gavetas porque quer limpar e organizar tudo por dentro. E vem arrumando, de dentro para fora, tirando a poeira das coisas do tempo que só vale a pena guardar, prá usar, construir. Hora de pisar na cozinha, picar o tempero e haja cheiro de alimento no ar. Limpar o chão que se pisa, lustrar a mobília e mostrar todo brilho e beleza do banco que foi feito com a madeira de demolição. Lavar roupas sujas, as louças e as mãos. E depois de decorar o interior e a fachada, perfumar, por dentro e por fora. Recolher todo lixo, separar, destinar. Desapego é o emprego correto é o verbo ideal e o que tiver de ir, deixar ir, reciclar. Renovar é energia. Coisas a limpar e remover do tempo, no tempo certo de ir. Olhar e ver que agora tudo está limpo e por compreender - esta - é a hora de viver. Hora de banhar e receber, usufruir ou guardar, muito ou pouco. Estela faz tempo e ensina que com arte se faz diarista do tempo.
Arte Digital e desenho livre: Tonho Oliveira
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Por Sueli Maia (Mai) em
10/01/2009
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Entra menino, sai da chuva. E a terra molhada é cheirosa. Brincadeira na chuva e o sujo escorre com suor e suor de criança tem um cheiro que é azedinho. Cheiro prá lembrar do cachorro que se gosta. Mas o pelo molhado tem cheiro que faz torcer o nariz. Águas de cheiro no corpo e cabelo. Desalinho é lembrar que cabelo molhado tem cheiro. Cheiro do linho na roupa lavada e engomada. Pipoca de longe e de lá vem o cheiro da moça que não volta e que ainda se espera. Cheiro de esperar pai e mãe chegar prá só então tomar café. Café de toda hora na torrefação da rua de trás. Quarteirão onde, sem relógios, as horas se sabe pelo cheiro no ar. Ar com aroma de flores que cedo ou tarde exalam seu cheiro. Meninos e meninas a mascar chicletes e a guardar figurinhas perfumadas nas mãos e mãos tem cheiro de tudo que se pega sem lavar. Cheiros de bem respirar e em todas as horas, na rua de cima, o nome do cheiro era pão. Lá vem grito: - menino vai comprar o pão. Horas de pão quentinho. Olhos de menino com vontade e a memória é a manteiga derretendo no miolo do pão. Pão quentinho. Olfato ordenando a boca que umedece a língua. Memória atemporal e essas horas tem cheiros de lembrar ou de esquecer. Quarteirão das horas do cheiro que aqui se há de lembrar.
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Música: Vanessa da Mata - A carta
Por Sueli Maia (Mai) em
9/28/2009
Benditas sejam todas as frutas. Cheirosas, gostosas, maduras ou de vez. E olha a fruta! Gritava sorridente a pregoeira a pregoar. Pois ainda haverá dia de aceitar que existe também um espaço sagrado às frutas de todo lugar. Frutas do mundo inteiro. Deliciosas as frutas e os frutos benditos de todas as castanheiras. Rua das castanholas sem número. Ali era um lugar ou apenas uma rua onde eu tinha meu banco de feira. Feira tão cheia de gente que mais parecia uma cidade a fervilhar, uma rua de gente a ferver. Falar do que é bom e bonito e olha que fruta bonita! Dulcíssima, quer provar? Porque quando por fim se compreende o prazer de provar uma fruta, longe é perto prá de novo se querer provar outros tantos frutos e frutas há que se provar e bons frutos há, oh se há! Olha a fruta bendita e bendito é esse meu tabuleiro de vender porque aqui é o espaço sagrado das frutas, rua das frutas e há frutas em todas as ruas, em todo lugar. E há frutas em janelas a esperar e em muitas cidades há casas de porta e janela. Janelas sonoras, rua das castanholas e sob elas crianças a brincar, castanholas de jogar e bater nas janelas coloridas a bater e depois abrir. Longe ou perto dali há frutas cobertas com véu e mantilhas. Missal de pregoeira a pregoar a beleza das frutas porque em tudo há beleza. E benditas sejam todas as frutas e frutos que daquela e de outras ruas cheirosas, são benditos e bonitos de se ver.
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música: Marisa Monte - Give me life
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Por Sueli Maia (Mai) em
dos recursos renováveis
9/23/2009
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Cio de águas e em ar respirável há luz e novas manhãs. E uma nova luz amanheceu eternidade, na eternidade que se dá em cada dia ou em apenas um segundo quando se vive este segundo, como se fora uma vida inteira. Manhãs respiráveis com nascentes preservadas e nós estamos e somos, água e ar, todo ar que se possa respirar ou água a escorrer e livremente escoar. E se por vezes fomos noites nas águas caídas das chuvas, um novo dia amanheceu. Então renascidos em nascentes, sussurramos manhãs com desejos eternos de água e ar, prá beber, respirar e, mansinho, prá sempre ficarmos imersos em vida. Eu, tu, nós em teu rio, em minhas águas e na luz das manhãs, tua e minha. Banho-me em ti e em mim tu te banhas por segundos sem fim. Porque eu sou boca de mar engolindo teu rio e devolvendo tuas águas em minhas águas, encontro das águas. Noites - mortos eternos - dormimos e mortas, as noites renascem nos dias seguintes, disfarçadas em bocas d’água ou mil olhos d’água que saciam as sedes, ebulindo suas águas nas bocas. E uma boca noutra boca disfarça as fomes e assim nos rompemos na areia e em segundos eclodimos - serenas manhãs - em luz de um agora que é sempre, pois – serenos - seremos nascentes perenes de infindos segundos.
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Por Sueli Maia (Mai) em
9/16/2009
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Ouvintes em frequência qualquer e de alguma maneira eu ouço o soluço daquele menino, ainda com medo de dizer que tem medo. Muito cedo há sons de baixa sonoridade ou em alto e bom som os alto falantes amplificam os sons das cidades, nas novelas diárias, em toda cidade. E quando há gritos muito cedo, o sono é agoniado então, é melhor acordar. Quando é manhãzinha, latidos atravessam o universo e em todo lugar há latidos, rasgando o silêncio das noites. E com o sono bebendo manhãs mal dormidas, há Homens, bebendo manhãs, mal dormidas manhãs. Eu ouço tudo e sempre levanto bem cedo e desperto com força a fraqueza de cedo acordar, desde cedo, bem cedinho acordar. E quando ainda é cedo prá acordar, é preciso ter força prá não mais dormir, levantar acordada e seguir pro trabalho, ainda bem cedo. Quando o trabalho chega cedo, cedo, despertam - crianças desacordadas e feito homens com medo, não dormem, não querem dormir o seu medo. O medo acua, cala, recua, afugenta ou faz gritar, qualquer voz como em alto falantes. Eu ouço gritos de acordar, que é prá não perder a hora e acordar. E quando se acorda aos gritos, o coração acelera, o medo vem cedo, aumenta e volta com gritos, no silêncio, no meio da noite, no medo da noite. Mas sempre ouço, o grito de silêncio dos homens amanhecidos no cedo do sono. Me arde os olhos e deixa na boca o gosto de não mais dormir, saber que amarga o beber prá dormir, sem ouvidos de ouvir os gritos nos alto falantes que cedo acordam, o sono de meninos e meninas, quando ainda é cedo.
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Música: Across the universe
Por Sueli Maia (Mai) em
9/15/2009
Palcos. E os espaços públicos estão repletos de gente apressada, casais estressados que junto com as pedras, chutam, seus amores e paixões. Mas sempre apressados, sob lentes escuras, disfarçam olhos vermelhos e amores havidos em idas sem volta. Lembro que em um carnaval vi desfilar, no enredo de uma escola, uma dessas tragédias na apoteose. Mas nunca estive tão próxima de algo semelhante. Dramático e ao mesmo tempo interessante, assisti de camarote uma cena incomum pelo fim do final, em tragicomédia. Ela era alta, bonita com a malemolência comum das mulatas cariocas. E chegou, porque sabia chegar, numa minúscula saia jeans e um top que só cobria o necessário. Ele, igualmente bonito e alto, parecia estar aflito mas não disfarçava um sorriso moleque. Entre o seu argumento e a escuta do que ela dizia sem qualquer segredo ou disfarce, ele parecia se divertir com um jeito displicente. Ela sacudia os ombros e girava um chaveiro que mantinha na mão. Inevitável foi ouvir aquele adeus provocativo. Em tom ameaçador ela dizia você vai babar e eu vou dizer que não. Alem do chaveiro e dos ombros, ela balançava as ancas, gingava e fazia babar não só ele, mas os homens que ao redor não disfarçavam. Uma imensa platéia no aeroporto. Por fim ela gingou e girou e, com uma lenta malemolência, se foi, desfilando sobre o salto, o seu rebolado. Ele, com um sorriso nada trágico, limpou, porque babava e correu. Não pude ouvir o final, mas antes do embarque ainda vi, o beijo apocalíptico do casal malemolente.
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Música:
Maria Gadu - baba
Céu - Malemolência
Por Sueli Maia (Mai) em
9/14/2009
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Esse texto é apenas um tratado ou uma nova tentativa de dizer. É, eu amo tudo que faço. O problema – me dizem – é a forma. Sei que existem mais belas, mas não aprendí a elipse ou talvez eu ainda não saiba fazer diferente, quando digo o que se sinto. Então eu direi, sinto muito, porque sinto tudo ao redor. Sinto a beleza da seca e da chuva, na beleza do que é húmido e inóspito. E também sei dos estragos quando são demasiados. Sei que em alguns territórios muita coisa está ruindo. E sei que para unir, construir, rejuntar, há que ter paciência de esperar, fazer devagar, com cuidado. Sei que há que se ter uma espécie de indulgência. Porque quando se quer sentir outra vez, o que se sente no que se ressente são histórias e geografias misturadas nos mundos e peles que se apressam em atos de guerra. Mas arte não combina com pressa e por isto há tempos eu tento escrever uma genealogia da paz, minha paz, tua paz, nossa paz. Benditas sejam as palavras bem ditas. E benditos - o olhar que não denigre, o verbo que não humilha, a mão que não agride. Bendito esse Eros resoluto que toca, ouve, olha e diz, com palavras bem ditas, as benditas palavras que tocam um lugar que nem sei, e porque sinto, sei, existe um lugar. É complexo viver em paz e é simples perceber que o presente é o tempo correto de amar, em tempo bastante para amar e fazer diferente. E diferente é – diferente - a sí amar e amar o diferente a sí, e na diferença sentir a igualdade e amar qualquer um, diferente e igual. Saber-se incompleto e no tudo que se é, saber que cada um só pode fazer a parte que, no todo, é a parte de cada um. Entre o verbo - amar - e o tempo, todo resto é lapso - tempo vão - no tempo de amar. Unicamente amar. Agora é hora de em silêncio ouvir. Por que os joelhos doem e as chuvas caem em todo território. Um Eros resoluto e tolerante, talvez demarcasse nesses mundos, novos territórios de paz.
Por Sueli Maia (Mai) em
9/09/2009
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Me encanta ver, o mover da liberdade nas pipas, colorindo o ar. Gosto de sentir a leveza e por vezes em silêncio, reproduzo movimentos de delicadas bailarinas. Mais que ser leve, aprecio a alegria de viver em paz. Liberdade é sentir o cheiro da seda dançando ao vento e deixando o perfume de limpo no ar. Liberdade é sentir que o tempo de se querer bem pode durar, o mais que ele possa durar. Basta sentir devagar, sorver cada passo, sentir cada dança, cada gesto e, lentamente sentir,re-sentir e, outra vez bemquerer. Gestos como bons perfumes permanecem no ar e depois que se vai, eles ficam no ar. Há algo - sagrado - que não se vê, enquanto as pipas se movem e permanecem no ar. Entre a posse e a perda, o que se assiste é um espetáculo de leveza e liberdade que oscila entre bemquerer e malquerer, sentir e ressentir, subir e descer, ganhar e perder as tantas e outras pipas que permanecerão, ainda no ar. Bonito é ver, com seriedade, a alegre brincadeira das pipas em silêncio, rasgando o céu com a leveza da seda, suspensa na linha. Existe, um espaço sagrado em tudo que move e não se vê. Existe. E sempre que pipas subirem e dançarem no ar, existirá o re-sentir de se ganhar e se perder. Me encanta ver, o mover da liberdade colorindo o ar.
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Música: One love
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Por Sueli Maia (Mai) em
9/07/2009
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Em tudo o que vejo, eu também admiro a economia das coisas exatas. Admiro o retorno do eco e dos bumerangues, quando são exatos. Há coisas tão redundantes e óbvias, que não precisava dizer, porque o silêncio é econômico. E para ser mais exata, a verdade, também é econômica e ainda há uma infinidade de coisas e maneiras de ser econômico. Na exatidão da vida, os dias são iguais e são tão diferentes do sempre... Olho com um olhar diferente e, na hora exata em que despe seu azul - o céu - do laranja ao vermelho, se veste para a noite e, óbvio, vai daqui romper lá, noutro ar, sua luz e raiar mais um dia e tão obviamente... Óbvio, é o tempo a passar e não somos os mesmos, ou somos e não somos óbvios? E se somos iguais e exatos, também somos econômicos, como o retorno dos ecos e dos bumerangues, quando são exatos.
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Por Sueli Maia (Mai) em
9/05/2009
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Novo dia acordando indolente e as horas no horário solar marcavam o tempo correto das coisas da vida, no tempo solar. E quando chega esse tempo, chega na hora em que a luz de um sol, é pura energia. Estava tecendo fibras e misturando contas coloridas, fazendo alquimia com o tempo. E no tempo, a luz como a calma da luz, se fizeram chegar. Foi um clarão penetrando a escuridão. A densidade se rompeu com o lume e iluminou toda ilha e a floresta da ilha, também. Fiat lux! E tudo aquilo que era sombra se fez luz, e não era mais preciso temer. Noutro lado da ilha, os raios de sol projetaram a lâmina d’água e uma cortina multicor revelou um halo suspenso no ar. Não sabia precisar quanto tempo estivera com medo da sombra e da ilha, na floresta da ilha. Sabia que o tempo era havido e bastante. E sem pressa, ela enfim percebeu o seu tempo. O tempo das coisas do tempo, e o tempo havia em mistério, perigo e beleza. E na ilha e nas sombras da ilha era o tempo de agora. Mas agora era o tempo da calma e da luz.
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Música: Ain't no sunshine when she's gone - vários intérpretes