Inspirar-Poesia, um segundo sopro

a rebeldia dos oblíquos

Por Sueli Maia (Mai) em 12/30/2009
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O tempo passa e inevitável é pensar que amanhã será um dia comum, talvez último, com horas a menos e a mais. Admito ser estranho lembrar Duomo e Pisa neste instante e tão incomum quanto instigante é pensar as sutilezas e os poderes que sustém o oblíquo. Então abro os olhos para o espectro da euforia e piso o chão. Eis o poder de inspirar o ar. Evoco uma fibra qualquer e a memória da pele. Porque talvez a rebeldia do oblíquo seja essa teimosia que faz resistir, desafiar ou irromper entre as fendas uma vida qualquer. Porque o desvão de um baque é uma brecha e a valentia da ferida é uma crosta e no exposto disso tudo eu agacho e limpo qualquer coisa que escorra. A persistência de cambaio é a cena do atleta que completa a maratona e desmaia após a linha. Retrovisores do tempo em datas comuns. E cuidar do engano do engodo do crédito é estima, e viés que rima é erro, e honra é rito e do guerreiro o grito é guerra. E naturalmente é só dezembro que está acabando ou mais um janeiro que volta com um sopro de vida que vem prá mais tempo e história. E ela volta com fatos que emergem ciclicamente. E reprisando, tudo é como o filme biográfico que se faz em culatra e deflagra no biografado a memória dos seus ideais. Amanhã, numa tela ou na areia, menos e mais um dia e vida a mais e a menos junto ao pulo do ponteiro. E depois respirar, chorar, sorrir, abraçar e escrever o novo numeral e traçar metas e desejar nos rituais de reinício. E assim eu desejo mais fôlego na travessia dessa lâmina d'água que refrigera e desperta para um novo e simples bom dia!

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Bom 2010 para todos!
Imagem: Google

correspondentes

Por Sueli Maia (Mai) em 12/23/2009
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Talvez eu seja apenas uma estranha correspondente das linhas que escrevi e nunca soube ao certo destinar. O certo é que não ouço vozes, mas sinto um impulso flagrante ao qual cedo, porque escrevo destinos, quereres, saudades e dos amores suas guerras e paz. Houve dores que ao descrever também pude sentir. Escrevi intenções e vazios, mas também os sorrisos, explosões e olhares que percebi como miragens a inspirar-me poesia. Descrevi realidades tão estranhas como linhas paralelas que estando em mesmo plano não encontram um ponto em comum. Não sei se fiz bem porque talvez estas cartas sejam apenas migalhas sem valor, mas deste ofício em que me fiz correspondente, eu literalmente o fiz por amor ao amor. Então escrevo esta ultima carta que fala de um presente e que junto às demais posto à frente da hélice de um imenso avião que por ai as haverá de espalhar.

"Meu amor, não te aflijas. A minha perna já não dói. Mas antes de ir-me de uma vez, eu preciso dizer que me deste o meu maior presente que chamamos Simone. Um beijo."

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Um bom natal para todos.

Mai


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Música: Caetano Veloso - Cajuína e Quereres - Maria Betânia. Baião malandro - Hamilton de Holanda
Imagem: Google

irrevogáveis

Por Sueli Maia (Mai) em 12/16/2009
Regressivos finais de um filme onde há um duelo entre os atores principais. Há piratas espalhados no cenário se escondendo por trás da fumaça dos gases letais. Figurantes vestidos de gelo estão a pingar, a brigar ou brincar com o que há de mais sério no mundo. Olha a claque: - Gravando! À deriva e devagar estamos todos no mesmo barco do degelo. Há vidas sangrando oceanos. Piratas singrando nos mares, espreitando tesouros que estarão fatalmente perdidos quando tudo terminar. Fatal mesmo é esquecer de lembrar que no epílogo da vida, do fim mudo restará uma pobreza plural. Estátuas de gelo começam a pingar lentamente. Magnatas-piratas e gigantes-pigmeus, por favor não esqueçam do instante irrevogável que começa no segundo primeiro, após o minuto final. 15...14...13...
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Imagem: Google

monografia ambiental

Por Sueli Maia (Mai) em , , 12/15/2009
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Não sei precisar quanto tempo, lembro apenas que estava desatenta quando tudo aconteceu. Sinto frio nas mãos e no estômago. Meus ossos estão frios e a pele gelatinosa. Sinto um medo estranho e fatal. Uma espécie de degelo escorre sobre minha cabeça. Foi tudo muito rápido. Coisa medonha de sentir. Um choque nas costas, um jato gelado contra o corpo ainda quente, fez parecer que me quebrara ao meio. Foi no pesadelo dessa noite que eu afoguei. Comigo estava muita gente, lixo e bichos boiando lentamente. Terror, ficção e agonia real. Um tsunami de horror e caos. A morte tem uma face perversa que se compraz com pesadelos em noites sem fim. Lembrei de gritar, mas o grito não saiu. Fiquei imóvel por um tempo, mas novamente o desespero de não acordar me assaltou. Há momentos de desesperança que exigem a coragem de permanecer, resistir. Então decidi esperar e porque minha voz não saia eu tentei respirar novamente, mas célere como um lince voando sobre a presa, o pesadelo me engoliu outra vez e a agonia me entrou boca adentro. Não consegui respirar e parei. Há momentos que são como a fome e a pobreza que parecem não ter fim e depois quem as vence se esquece. Mas há instantes de extrema impotência em que é preciso confiar e persistir porque resistir pode ser uma questão de vida ou morte. O tempo se esgota e exaure. Enquanto isto, eu sinto uma placa de gelo sob meus pés.

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Música: Renato Russo - Mais uma vez

amenos cordéis

Por Sueli Maia (Mai) em 12/11/2009



A fala era fraca e desconexa, mas eu conseguia ouvir. E dizia baixinho:
- há menos gestos e mais silêncio nesse canto do mundo. Mudos; estão todos mudos; e surdos, tudo parece distante. Há menos gritos lançados, há dor a mais, e tudo é dorido se arde a pele, e tudo arde. Pois se um tecido suave encosta na pele que dói, tudo volta num instante.
Mas eu ainda quero vida, seguia quase a sussurrar: - É delicado tocar os cordões que sustentam as coisas, e entre as roupas estendidas nos varais e a brisa perfumada que desprende e se sente, há coisas que insistem em pender.
Hora de acertar ou se esconder.
Mas o mundo está super aquecido e as coisas se amornam enquanto corpos esfriam, e tudo no branco do frio é cinzento e lancina, não importa a estação, o trem ou os trilhos, porque entre os extremos de frio e calor há vida a menos e mais solidão.
Mas tudo cansa; e em suma o mundo está chato e mesmo assim é preciso viver chateado e sorrir.
Veias e vias, em cena acenos e mais despedidas às mãos. Onde havia calor há menos encontros, mais dor, e muito se renova no calor, mas o largo da dor se amplia e tudo requer serenidade.
[Amenos, pensei, sejamos amenos].
E nos extremos purgados nas latrinas, um opiáceo qualquer rebaixa a tensão.
[Mas afinal neste espelho sou eu?]
Logo ali a palavra seguia lenta, mãos trêmulas, inquietas...
E enquanto tênues, os cordonetes trançavam o espaço, eram vazios que pendiam nos cordéis cortinando roupas a secar com silêncio e solidão.
Vento suave na face, é o tempo erupindo o secreto.
Mas a alma cansada está calma enquanto eu estou aqui e sigo fingindo o que exaspera. Agora me resta a espera do que ao vento descortina em nus. E na agonia das roupas pendidas, tremulam os amenos cordéis.


Imagem: Google

restinga de nós

Por Sueli Maia (Mai) em 12/10/2009
Há lugares intocados e tão fundamentais como as restingas onde a preservação se dá, justamente, pela falta de acesso do homem ou porque, ao redor, todo o mar é bravio e turvo. Acordei lentamente e sem voz. A garganta não dói mas ressente as horas seguidas sem nenhuma palavra vibrar. Quebrar o silêncio sem nada acrescentar ou dizer, é tão inútil quanto a lavagem compulsiva de mãos fora da lida, quando o que se tenta lavar não está nas mãos. Há restingas de nós e em nós e há silêncios tão necessários como as áreas restritas de restinga. Há lugares assim, abundantes. Há dias assim onde tudo além da natureza e do tempo é um lixo degradante e nocivo. É delicado caminhar sobre o que arde. Mas se o sagrado se contempla na hora exata do querer, a consciência só desperta quando queima uma chama e dói. Estou numa faixa de areia onde a vegetação toca o mar mas que pode acabar na elevação do nível dos oceanos.
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Música: Mozart

minimalismo, o degelo global

Por Sueli Maia (Mai) em 12/09/2009
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Não havia lugar no mundo para onde tantos fixavam o olhar. Não havia lugar no mundo onde tão poucos se negavam a crer. E enquanto penetravam o interior das geleiras, o degelo inundava o planeta.
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dedicados aleatórios

Por Sueli Maia (Mai) em 12/08/2009

Dedicados companheiros numa estrada qualquer. E o vento batendo no rosto era ele era eu, era o tempo e a mais louca liberdade a nos guiar. Céu a nos proteger e o infinito éramos nós a nos perder em sorriso, no medo e coragem que eram aqueles aleatórios fractais que vinham e iam conosco na estrada. Ele era ainda um rapaz e eu o universo de nós dois a ouvr aquela canção. Olhos fechados e as luzes a surgir eram alegorias multicores que brilhavam e piscavam num céu que nos seguia em todas as curvas do caminho. Descaminhos a nos perseguir e quem me guiava era ele e imantado em meu abraço nós nos perdíamos de nós e em nós. A velocidade era o mergulho e a decolagem e aquilo tudo ainda hoje é muito grande porque em beleza, as imagens nunca se vão. E porque ouço esta mesma canção elas voltam. Ele era um menino e eu me vistia com seu corpo e o aquecia com meus braços. Dedicados companheiros são como vestes confortáveis sobre a pele. Roupa que mesmo velha se veste se despe e se guarda e acaricia porque fiel, ela se modela e se molda ao novo corpo que é sempre o mesmo na memória da roupa que guarda. Chamego que se tem e se quer bem porque retém o cheiro do tempo que vai e que volta toda vez que os olhos se fecham e a memória se despe e adormece em mais uma estação. Ele é um homem que eu guardo menino secreto no armário junto ao Jeans dedicado que eu não dou a mais ninguém.


Músicas: Patrick Watson - man like you e drifters

difusores no ar

Por Sueli Maia (Mai) em 12/05/2009
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Pode ser! E agora estou aqui, encrespada e fervendo. E esta é uma onda sonora em difusão. Tudo bem, eu dancei, tô dançando. Mas agora estou numa balada qualquer e nessa frequência, em qualquer lugar que estejas, ouve essa música e vem dançar se quiseres também. Vem agitar com isso que usou e que bem abusou. Vai, larga tudo prá lá porque a vida é confusa mas difusa é essa tua tristeza que reverbera no tempo e no espaço e que só exacerba o cansaço de viver. Levanta! Porque obtuso é todo esse mundo entre o eu e o que não sei. Mas o sol também é sozinho e forte se ergue e se arregala todo dia e a cada dia raia em novo sorriso e em qualquer lugar do planeta há luz, novo dia, outro sol. Coragem! Deseja tudo de novo e outra vez e deseja qualquer coisa, mesmo que possa até nem conseguir, mas deseja! Porque afinal tudo na vida pode ser. Distorção entre graves e agudos e bem ali há uma palavra em desalinho que reflete esse silêncio dissonante. Se quase tudo pode ser é assim que eu danço, eu canto e deixo estar porque tudo pode ser. Mas... e se tudo aquilo for nada daquilo, porque e prá quê tanto frio doendo e os ossos quebrando assim? Porque esse nó na garganta? Eu poderia ter acostumado com tua ausência se a tua presença não fosse maior. Brincar com o impossível é isso. Porque o tempo corre e tudo corre enquanto muito ocorre e muito foge de nós. Há difusores buscando equilíbrio no desequilíbrio extremado. Há um quarto cheirando a lavanda e as paredes difundindo a gravidade ainda refletem bons sons equalizadamente. Mas não demora porque se tudo pode ser, pode até ser que amanhã eu nem esteja mais aqui, ou nem ai.
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Música:
NSync - happy holidays, Tom Jobim, Zimbo Trio - chovendo na roseira
Chris Rea - driving home - Debussy - Reverie






cartografia clichê

Por Sueli Maia (Mai) em 12/02/2009
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Bebi mais que comi nos últimos dias, mas estou bem. Trânsfuga. Estou meio tonta e apenas o instinto me guia neste instante. Tateio. E tatuado em minha pele tu estás. Formigas apressadas trabalhando e aqui no oco da minha cabeça rascunho esta cartografia clichê de dezembros. Eu sei, sou piegas, esta seria a tua fala, eu não me importo. E mesmo assim é prá ti, pai, que eu escrevo neste instante. É que numa fotografia qualquer que encontrei, eu estou em teu colo. Teus olhos, tua barba, tua boca, teu sorriso me entrou como um mantra repetido em vibração. Idelével, eu entôo teu nome - te amo, pai. Tuas palavras ressoam em meus ouvidos, o cheiro da tua pele me desperta e tu estás sempre comigo. Creio em ti. E acho até que essa minha estranha mania de ter fé, vem do quanto te espero ou desse teu jeito estranho de me fazer acreditar nas coisas. Uma fé diferente que me arrepia os cabelos. Lembrei teus cabelos e em tudo tu estás. Eu te desperto em mim e sempre que estou em apuros te quero por perto. Acorda, levanta, te alegra, me manda um sinal, eu preciso de ti, eu me orgulho de ti e como sinto tua falta... Preciso te contar um segredo - é por ti que eu vivo. Não sei bem porque, mas meu corpo inteiro formiga agora. Vagueza é isto que sinto e porque incomodamente me faltas, é que neste instante cada fibra do meu corpo grita teu nome e hoje preciso dizer - te amo demais, meu pai. Escrever cartas é um estranho ritual que desperta coisas. E cada dia levantar é impulsão, necessidade e pés no chão. Mas junto contigo, o sol me adentrou a janela. Já é dezembro, pai. E na cartografia dessa minha saudade, sussurrar o teu nome e dizer que te amo, eu sei, é clichê.
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drops...

Por Sueli Maia (Mai) em 12/02/2009
Drops caindo no colo e outro - de anis, ardendo na língua. E o azar daquela moça foi assistir novamente aquele filme. E sonhou com a alegria de um banho de chuva e ouvindo os pingos da chuva ela dançava aquela música, tamborilando na vidraça. E acordou ouvindo baixinho uma criança a chorar. Era a mesma criança que sempre ela via, vendendo drops nas calçadas. A música ao fundo era a mesma, o ritmo entrecortado era o mesmo e era o mesmo, o espanto da moça que, no vinil, escutava o mesmo cantor. E era óbvio que ela ouviria o disco girar em silêncio. Mantinha a calma com a criança mas ela mesma, gritava por dentro ouvindo aquela canção, soluçar em replay. E existe um tipo de amor que não é o que sente uma mãe mas é uma espécie de amor que arrebata os humanos. Porque ver uma criança ferida chorando de medo, desperta a vontade de acolher, conter junto ao colo e baixinho cantar e fazer dormir e deixar sonhar... Queria a alegria daquela criança brincando na chuva, sorrindo com a chuva e na boca, um drops de anis...
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