eufêmicos
Por Sueli Maia (Mai) em 1/26/2010.
Como velhos parceiros nos reconhecemos e nos comunicávamos pelo olhar. Márcio era impulsivo e no fazer das horas era um general de feitio cuja única disciplina era o trabalho que era elo, mundo e sina. Um anarquista com vícios que não combinavam com a persona sisuda que interpretava gestualmente. Gago e talvez por vergonha era econômico ao falar. No ir e vir dos dias disfarçava bem os seus desvarios. E ainda era maniento e obcecado por ser autoridade. Quando o vi pela primeira vez ele estava em apuros e desde então seguimos juntos com pouca fala, muita culpa e olhares de cumplicidade. Tão efêmero quanto vital, o gozo rebaixa a tensão num instante. Dolores e eu o esperávamos costumeiros para a reunião em casa de Alice e Pedro. Não há recomendação capaz de frenar um impulso. Estranhamente a sua gagueira desaparecia após a segunda dose e quando desandava a contar estórias e andanças quixotescas e reais, seu tom de voz sobressaia. Naquela noite algo parecia mais tenso e porque chovia estávamos todos muito próximos a ouvir e gargalhar sobre almofadas. Senha proibida - Alice o desafiou. A excitação potencializa a força do homem. De modo estranho, Márcio pulou do chão ao teto e agarrado ao lustre ficou com as pernas em pêndulo e até parar, todos gritavam: - vai morrer! Márcio vociferou: - Domingos suba aqui! - Olhei prá ele, ergui os ombros e as mãos. Descontrolados, Pedro e as mulheres se entreolharam e ele se apressou no comando: - venha Domingos, agora! E Dolores perguntou chorando: - quem é Domingos, Márcio? Só estamos nós quatro aqui!
Música: Asa Branca - Vitor Araújo.
23 comentários:
Suas histórias estão cada vez mais afiadas, devagarinho, devagarinho nos remetem ao âmago da existência. Beijo.
fantastico !
porque acabou ?
seu jeito de fazer uma cronica correr e bem familiar para os impulsos !!
Muito bom. Muuuito bom mesmo.
Perfeito!
legal
Eufêmicos... Totalmente. E ele nem subiu pelas paredes. :)
Adorei, M<ai. Beijo.
Crônica ou conto. Ta mais para conto. Pequenos contos são sempre uma delícia.
Diferentemente dos que comentaram antes tive dificuldade para entender. Fui lendo e relendo com a chave que você deu: eufemismo. Li o que esta em itálico e percebi a explicitação do desejo. Mas, senha proibida - Alice o desafiou...? ou o provocou(sexualmente) E o chamado para o Domingos...? Pular para se balançar no lustre?
Vejamos o sujeito, ele é:
- impulsivo,
- disciplinado
- viciado em trabalho
- sisudo, estranho
- "gozava" com a própria autoridade
- gostava de "reuniões"
- gago
- gostava de bebida alcoolica
- calado mas falante sob o influxo da bebida
- louco? reprimido sexualmente?
Mas, para além da história, que não entendi, a forma que vc escreveu é maravilhosa, um texto escrito no cuidado.
Beijo.
Uma contista, quando cose figuras assim no retalho do texto, deixa os leitores suspensos, sustenidos em suas [i]lustres linhas, sim! Até que a luz dê um clic! Ou se estale no chão.
Mai, para mim, o final é uma hipérbole, menina!!!
:)
Beijos.
Muito bom, mesmo, mas também não sei se entendi bem O narrador era o tal Domingos uma espécie de amigo iamginário?
De qualquer a sua escrita está sensacional.
Abraços
Que clima! O eufemismo fica no tecido da história e dá pra entender por várias entradas. Muito bom, Mai.
...é Mai, eufemismo puro, isso para não dizer que Márcio não era louco, apenas estava embriagado, ou que o mesmo estava interpretando sua realidade e potencializando suas agruras. Acho que o Márcio é eufêmico com todo poeta.
Beijo,querida.
Putz, fiquei bebado só de ler...
Mas assim como aquela sua ourta postagem, o final deixa um mistério no ar...
Eufemismo...´fiquei na dúvida...mas o narrador és tu ou estou enganado...caramba, será que Domingos é o seu alter ego?
Ahh...só sei que ficou porreta...
Já comeu bolo né..rsrs
Um abraço na alma...bjo
Perdi o fôlego!
Incrível, Mai! Você pega o leitor e faz ele participar do conto.
Eu já me via pendurada no lustre...
Maravilhoso!
Beijos
Mirse
Minha doce Mai obrigada pelo carinho e preocupação, estou bem e em Lima longe dos perigos.
Beijos de luz!
muy bonito e ingenioso relato. me encantó.
besos
Bem caracterizado... ô loko!
Abraço
Alice e Pedro me lembrou aquela vídeo-história. Talvez tu tenhas tirado os personagens de lá. E incendiaste minha curiosidade com esse conto: quem é Domingos?
Delicioso de se ler!
Será Domingos alguém que já se foi?
Querida, obrigada por me visitar e acarinhar com tuas palavras.
Beijos!
"... o invisivel
nos salta
aos
olhos".
Mai, sua escrita é peculiar e diferente de tudo que já li!!!
Texto de ótimo feitio!
Um beijo, amiga!!!!!!!
Por que o efêmero normalmente é considerado pouco? Efêmero pode também ser suficiente, pode ser muito, pode ser tudo.
Por que o carnal geralmente é considerado reles? Os prazeres físicos, em última análise, são mais uma forma de satisfação, como tantas outras que entendemos mais "dignas".
Por que Dolores só admite a existência daquilo que seus próprios olhos enxergam? O meu mundo é o que eu conheço, mas há tantos mundos coexistindo por aí.
O que, afinal de contas, é real? E a sanidade, quem define seu conceito? Quem se aventura a fazer julgamentos de valor num mundo tão estranho? E olha que "estranho" foi um eufemismo... rs.
Bjs, querida.
Confesso que fiquei com um pouco de medo. :D
Ótimo fragmento.
Beijos.
Interessante mesmo! Seu texto prende nossa atenção de forma fascinante!
Vc deveria escrever um romance ou um livro de contos, eu seria a primeira a comprar =).
Beijos.
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